Cerca de 70% das substâncias químicas e resíduos, que contaminam os oceanos
29/01/2014 21:02
Segundo estimativas da Organização das Nações Unidas, ONU, cerca de 70% das substâncias químicas e resíduos, que contaminam os oceanos vem de atividades humanas na zona costeira. Os outros 30% vem de acidentes ou descargas feitas por navios, plataformas de petróleo e incineradores de alto mar. Todos os anos são despejadas pelo menos 6,5 milhões de toneladas de lixo nos oceanos, sem contar os navios de cargas tóxicas, que misteriosamente desaparecem ou voltam ao porto vazios, depois de serem recusados por vários países; ou as contínuas descargas de esgotos; ou vazamentos não noticiados; ou naufrágios de submarinos nucleares e assim por diante.
Os oceanos são imensos e parecem capazes de absorver tudo isso. Mas não são infinitos. O lixo e as descargas biológicas e tóxicas não desaparecem, nem se subtraem: eles se somam e se acumulam. E tem efeitos sobre a vida marinha. Basta lembrar dos encalhes de baleias e golfinhos, cujos sistema de navegação pode ser afetado pela poluição. Ou recordar a triste figura das aves cobertas de petróleo, debatendo-se como mortas-vivas. Ou analisar o grau de contaminação dos peixes de mangues, junto a aglomerações humanas, que, apesar de acumularem metais pesados, derivados de petróleo ou vetores de doenças, continuam sendo consumidos, diante da falta de opção de boa parte da população.
O mar não está para as tartarugas, está repleto de lixo.
Em diferentes regiões do mundo um grande número de tartarugas marinhas vem sendo encontrado com plástico em seus tratos digestivos.
Também no Brasil, o excesso de lixo achado no mar é uma grande ameaça à sobrevivência das tartarugas marinhas que acabam ingerindo materiais prejudiciais a sua saúde. Corpos estranhos como plásticos, papéis de bala e de doces, tampinhas, pedaço de corda, dentre outros, quando ingeridos podem bloquear o trato gastro-intestinal causando necroses ou ulcerações (machucados ou cicatrizes) nessas espécies. Podem também interferir em seu metabolismo lipídico (absorção de gorduras pelo organismo), aumentar o tempo de trânsito intestinal dos alimentos ou contribuir para a acumulação de gases intestinais e flutuação incontrolável (quando o animal está com gases no trato intestinal ele não consegue afundar direito e fica boiando).
Só em 2006 os resultados de necropsia de tartarugas que estavam em reabilitação e acabaram morrendo, ou que já foram encontradas mortas em três regionais do TAMAR, demonstram a gravidade do problema. Em Ubatuba-SP, dos 70 animais necropsiados, 20 continham plástico em seus conteúdos gastro-intestinal; No Espírito Santo, de 25 tartarugas, 6 continham plástico. E na Bahia, das 11 tartarugas necropsiadas, 7 apresentavam o mesmo problema. Quanto à espécie, 24 eram Chelonia mydas (verde), 8 Eretmochelys imbricata (de pente) e 1 Caretta caretta (cabeçuda). Dentre outros, esse é apenas mais um problema que ameaça a vida desses animais.
Fonte: https://www.tamar.org.br/
Praia Local, Lixo Global
No carnaval de 2001, Fabiano Prado Barretto, surfista e fotógrafo de São Salvador da Bahia, na época com 30 anos, resolveu passar o feriado prolongado caminhando por praias desertas da Linha Verde, litoral norte da Bahia, mais conhecido como Costa dos Coqueiros. Ele caminhou, sozinho, por aproximadamente 86 km em 4 dias, sendo que no primeiro dia foi da praia do Forte até Porto Sauípe (24,5 km); no segundo, de Porto Sauípe até Subaúma (21,1 km); no terceiro, de Subaúma até Baixio (17,1 km); e no último, de Barra do Itariri até Sítio do Conde (13,5 km).
Esse trecho do litoral baiano é praticamente inabitado, especialmente nos trechos entre as vilas de pescadores, onde Fabiano chegava a caminhar 4, 5, 6... até 8 km sem encontrar ninguém. Porém, uma coisa ele encontrou, e muito, LIXO! A maior parte desse lixo era de embalagens industriais estrangeiras, algo que certamente não fazia parte do lixo produzido pelos pescadores locais, levando Fabiano a considerar que o lixo estrangeiro encontrado na Costa dos Coqueiros poderia ter sido trazido por correntes marítimas.
Extremamente surpreso com o fato, Fabiano passou a coletar as embalagens que achava mais interessante e voltou para Salvador carregando 81 embalagens coletadas entre a Praia do Forte e Imbassaí e 13 coletadas entre Subaúma e Baixio, a maioria dos Estados Unidos (10), África do Sul (9) e Alemanha (8), Bélgica (6) e Reino Unido (6).
Em fevereiro de 2002, Fabiano e Davi Neves, amigo e também surfista, caminharam novamente pela Costa dos Coqueiros, com o objetivo de coletar todas as embalagens estrangeiras que encontrassem no percurso de 62,7 km, entre a Praia do Forte e Baixio, para poder avaliar novamente as condições do lixo nessas praias. Recolheram 730 embalagens de 47 países diferentes, sendo que, dessa vez, os 5 países que apresentavam maior quantidade de lixo foram os Estados Unidos, Itália, Taiwan, África do Sul e Alemanha e 38% era de embalagens plásticas de água mineral
No meio de todas essas garrafas, havia uma que continha uma carta, escrita por um navegador italiano com as coordenadas do local onde ela havia sido jogada no mar – a mais de 4 mil km da costa baiana, em um ponto próximo a Ilha Santa Helena. Essa garrafa de água mineral havia feito praticamente o mesmo percurso que o navegador brasileiro Amyr Klink na sua travessia a remo da África para o Brasil, retratada no livro Cem dias entre céu e mar. Klink chegou na Praia da Espera, em Itacimirim, a 5 km ao norte da Praia do Forte, beneficiado pelas correntes, assim como a garrafa, o que comprovou que o lixo que chega nas praias baianas vem de locais bem distantes.
O tipo de embalagem, origem e local da coleta, também levaram Fabiano a concluir que o lixo não poderia ter sido jogado nas praias por turistas estrangeiros, pois é inviável que turistas tenham vindo ao Brasil trazendo lâmpadas, leite, inseticida, etc., sendo bem possível que esse lixo tivesse sido jogado em alto-mar por embarcações estrangeiras, tais como veleiros particulares, cargueiros e cruzeiros de turismo e levado até a costa baiana pelas correntes marítimas.
Mas há controvérsias quanto à origem desse “lixo globalizado”, o meteorologista Ricardo de Camargo, especialista em correntes e ventos na costa brasileira, considera um mistério o fato do lixo se concentrar no trecho de 4 km entre a Praia do Forte e Imbassaí, pois, segundo ele, há navios que têm o mau hábito de lançar lixo no mar, mas em sacos plásticos que não deveriam se romper nem chegar à costa. “A explicação pode ser a incidência de ventos de leste, muito comuns naquela área”, diz o pesquisador da USP. O Giro Tropical, um conjunto de correntes marítimas, poderia estar trazendo os objetos lançados de qualquer navio que passasse pelo Atlântico, entre África e Brasil.
Por outro lado, a oceanógrafa Ceci Moreira de Souza, do Instituto Oceanográfico da Universidade de São Paulo - USP, acredita que essas embalagens certamente são provenientes de embarcações que passam próximas à costa brasileira. “A possibilidade do material ter sido trazido de locais distantes como a Europa, por correntes marítimas, é praticamente nula”, afirma ela.
A Capitania dos Portos de Salvador informou que durante o verão de 2001, aproximadamente 350 navios estrangeiros cruzam as águas baianas em direção aos portos de Salvador, Ilhéus e Porto Seguro, trazendo turistas e cargas, e alguns, como o transatlântico italiano Rhapsody com capacidade para 800 passageiros, podem atracar até uma vez por semana durante nesse período.
The International Convention for Preservation of Pollution from Ships, uma espécie de bíblia da navegação internacional na área ecológica, em vigor desde 1973, mais conhecida como Marpol, determina que toda embarcação deve manter, sempre à vista, recipientes para juntar os resíduos produzido a bordo, sendo proibido, a qualquer embarcação, jogar lixo no mar. Porém, a fiscalização no Brasil, a cargo da Capitania dos Portos e da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) é deficitária, pois, para fiscalizar os 950 quilômetros do litoral da Bahia, a Marinha dispõe apenas de 9 embarcações e um efetivo de 50 homens. “O descarte de lixo em alto mar é um crime comum no litoral do Brasil”, diz a ambientalista do Greenpeace Viviane Silva.
Segundo Manuel Argolo da Cruz, chefe do departamento de segurança de tráfico aquaviário da Capitania dos Portos da Bahia, cerca de 35% das embarcações são abordadas por fiscais que devem verificar desde o estado de conservação do barco até o destino dado ao lixo. “A maioria dos barcos não joga lixo no mar, mas muitos apresentam indícios de terem jogado”, diz, admitindo não conhecer nenhuma multa aplicada por isso. “É difícil provar”.
Com um litoral muito extenso, o descarte de lixo em águas brasileiras, tanto por parte de passageiros quanto por parte das tripulações, pode ser feito de modo ilícito, a qualquer hora do dia ou da noite, sem testemunhas. O descarte de lixo na faixa de 200 milhas do mar territorial brasileiro é um crime passível de multa que pode variar de R$ 7 mil a R$ 50 milhões. “Apesar do rigor da multa, um flagrante, nesses casos, é praticamente impossível”, justifica o capitão-de-fragata e comandante interino da Capitania dos Portos de Salvador, Sérgio Silveira.
“Este tipo de crime só acontece porque o país não tem o respeito da comunidade internacional”, acredita o ambientalista Juca Ferreira, vice-presidente da Fundação Onda Azul e secretário executivo do Ministério da Cultura. Segundo ele, o Brasil precisa modernizar o conceito público de gestão econômica do seu território marinho que se estende por 200 milhas náuticas ao longo do litoral brasileiro. Até agora o país só discutiu a questão do ponto de vista financeiro e enquanto isso, nos tornamos quintal das grandes potências”, afirma Juca Ferreira.
Nos Estados Unidos, por exemplo, os comandantes dos navios que sujam a costa americana chegam a ser presos. Em todos os portos americanos, principalmente onde o fluxo turístico é maior, são distribuídos folhetos e material educativo sobre a importância de se preservar os mares e as campanhas contam com o apoio de voluntários e da sociedade organizada. Porém, quando estão fora das águas territorias americanas, esses navios parecem se esquecer de tudo isso e acabam jogando seu lixo em águas internacionais e de outros países.
Outro problema do lixo jogado no mar é que ele representa uma ameaça à fauna local, “os plásticos e vidros são perigosos sobretudo para os mamíferos marinhos e tartarugas”, explica o biólogo Gustave Lopez, coordenador técnico na Bahia do Projeto Tamar. Lopez cita um vídeo que mostra uma tartaruga com dificuldades para desovar porque sua cloaca estava obstruída por um saco plástico, “que são engolidos com frequência pelos animais porque os confundem com algas”.
Pelos dados do Projeto MAMA - Mamíferos Marinhos, somente no ano de 2000, quatro golfinhos apareceram mortos em praias do litoral de Salvador, vítimas da ingestão de plásticos, pois os animais, que têm a visão pouco apurada, costumam confundir esse tipo de lixo com sua presa predileta, a lula. No caso mais grave, registrado na praia do Canta Galo (Cidade Baixa de Salvador), em 1998, um golfinho adulto foi achado morto sem sinais de ferimentos e, durante a autópsia, os veterinários encontraram em seu estômago um pacote de arroz Uncle Bens, de fabricação norte americana. Ainda no ano de 2000, mais um animal foi vítima da poluição marinha, dessa vez um filhote de baleia Jubarte, com aproximadamente um ano de vida, pois ingeriu 3 tampinhas de garrafa pet que ficaram presas em sua garganta retendo a passagem do leite. “O animal acabou morrendo de inanição”, diz Luciano Wagner, coordenador do projeto, dessa vez o lixo era de origem brasileira.
Fabiano viu nessa triste realidade um desafio e uma oportunidade para retribuir ao oceano tudo o que ele já havia lhe proporcionado e continua proporcionando, firmando o compromisso pessoal de divulgar informações relacionadas ao lixo marinho, através de suas fotos ou de publicações na mídia, batizando essa ação de Praia Local, Lixo Global.
“Este estudo, é o primeiro que se tem conhecimento na Bahia relacionado à origem do lixo que chega às praias, trazidos através dos movimentos das marés” (Revista Travessia, abril de 2001).
A ação Praia Local, Lixo Global, que hoje conta com o financiamento da fundação alemã Lighthouse Foundation e com mais 3 programas de ação, id Garbage, Onda Verdee Amigos do Lixo, visa divulgar, pesquisar e combater o lixo global. Atualmente, o lixo marinho global que invade a Costa dos Coqueiros está sendo coletado e monitorado por estudantes e turistas para, futuramente, possibilitar a identificação dos navios poluidores.
Os oceanos são imensos e parecem capazes de absorver tudo isso. Mas não são infinitos. O lixo e as descargas biológicas e tóxicas não desaparecem, nem se subtraem: eles se somam e se acumulam. E tem efeitos sobre a vida marinha. Basta lembrar dos encalhes de baleias e golfinhos, cujos sistema de navegação pode ser afetado pela poluição. Ou recordar a triste figura das aves cobertas de petróleo, debatendo-se como mortas-vivas. Ou analisar o grau de contaminação dos peixes de mangues, junto a aglomerações humanas, que, apesar de acumularem metais pesados, derivados de petróleo ou vetores de doenças, continuam sendo consumidos, diante da falta de opção de boa parte da população.
O mar não está para as tartarugas, está repleto de lixo.
Em diferentes regiões do mundo um grande número de tartarugas marinhas vem sendo encontrado com plástico em seus tratos digestivos.
Também no Brasil, o excesso de lixo achado no mar é uma grande ameaça à sobrevivência das tartarugas marinhas que acabam ingerindo materiais prejudiciais a sua saúde. Corpos estranhos como plásticos, papéis de bala e de doces, tampinhas, pedaço de corda, dentre outros, quando ingeridos podem bloquear o trato gastro-intestinal causando necroses ou ulcerações (machucados ou cicatrizes) nessas espécies. Podem também interferir em seu metabolismo lipídico (absorção de gorduras pelo organismo), aumentar o tempo de trânsito intestinal dos alimentos ou contribuir para a acumulação de gases intestinais e flutuação incontrolável (quando o animal está com gases no trato intestinal ele não consegue afundar direito e fica boiando).
Só em 2006 os resultados de necropsia de tartarugas que estavam em reabilitação e acabaram morrendo, ou que já foram encontradas mortas em três regionais do TAMAR, demonstram a gravidade do problema. Em Ubatuba-SP, dos 70 animais necropsiados, 20 continham plástico em seus conteúdos gastro-intestinal; No Espírito Santo, de 25 tartarugas, 6 continham plástico. E na Bahia, das 11 tartarugas necropsiadas, 7 apresentavam o mesmo problema. Quanto à espécie, 24 eram Chelonia mydas (verde), 8 Eretmochelys imbricata (de pente) e 1 Caretta caretta (cabeçuda). Dentre outros, esse é apenas mais um problema que ameaça a vida desses animais.
Fonte: https://www.tamar.org.br/
Praia Local, Lixo Global
No carnaval de 2001, Fabiano Prado Barretto, surfista e fotógrafo de São Salvador da Bahia, na época com 30 anos, resolveu passar o feriado prolongado caminhando por praias desertas da Linha Verde, litoral norte da Bahia, mais conhecido como Costa dos Coqueiros. Ele caminhou, sozinho, por aproximadamente 86 km em 4 dias, sendo que no primeiro dia foi da praia do Forte até Porto Sauípe (24,5 km); no segundo, de Porto Sauípe até Subaúma (21,1 km); no terceiro, de Subaúma até Baixio (17,1 km); e no último, de Barra do Itariri até Sítio do Conde (13,5 km).
Esse trecho do litoral baiano é praticamente inabitado, especialmente nos trechos entre as vilas de pescadores, onde Fabiano chegava a caminhar 4, 5, 6... até 8 km sem encontrar ninguém. Porém, uma coisa ele encontrou, e muito, LIXO! A maior parte desse lixo era de embalagens industriais estrangeiras, algo que certamente não fazia parte do lixo produzido pelos pescadores locais, levando Fabiano a considerar que o lixo estrangeiro encontrado na Costa dos Coqueiros poderia ter sido trazido por correntes marítimas.
Extremamente surpreso com o fato, Fabiano passou a coletar as embalagens que achava mais interessante e voltou para Salvador carregando 81 embalagens coletadas entre a Praia do Forte e Imbassaí e 13 coletadas entre Subaúma e Baixio, a maioria dos Estados Unidos (10), África do Sul (9) e Alemanha (8), Bélgica (6) e Reino Unido (6).
Em fevereiro de 2002, Fabiano e Davi Neves, amigo e também surfista, caminharam novamente pela Costa dos Coqueiros, com o objetivo de coletar todas as embalagens estrangeiras que encontrassem no percurso de 62,7 km, entre a Praia do Forte e Baixio, para poder avaliar novamente as condições do lixo nessas praias. Recolheram 730 embalagens de 47 países diferentes, sendo que, dessa vez, os 5 países que apresentavam maior quantidade de lixo foram os Estados Unidos, Itália, Taiwan, África do Sul e Alemanha e 38% era de embalagens plásticas de água mineral
No meio de todas essas garrafas, havia uma que continha uma carta, escrita por um navegador italiano com as coordenadas do local onde ela havia sido jogada no mar – a mais de 4 mil km da costa baiana, em um ponto próximo a Ilha Santa Helena. Essa garrafa de água mineral havia feito praticamente o mesmo percurso que o navegador brasileiro Amyr Klink na sua travessia a remo da África para o Brasil, retratada no livro Cem dias entre céu e mar. Klink chegou na Praia da Espera, em Itacimirim, a 5 km ao norte da Praia do Forte, beneficiado pelas correntes, assim como a garrafa, o que comprovou que o lixo que chega nas praias baianas vem de locais bem distantes.
O tipo de embalagem, origem e local da coleta, também levaram Fabiano a concluir que o lixo não poderia ter sido jogado nas praias por turistas estrangeiros, pois é inviável que turistas tenham vindo ao Brasil trazendo lâmpadas, leite, inseticida, etc., sendo bem possível que esse lixo tivesse sido jogado em alto-mar por embarcações estrangeiras, tais como veleiros particulares, cargueiros e cruzeiros de turismo e levado até a costa baiana pelas correntes marítimas.
Mas há controvérsias quanto à origem desse “lixo globalizado”, o meteorologista Ricardo de Camargo, especialista em correntes e ventos na costa brasileira, considera um mistério o fato do lixo se concentrar no trecho de 4 km entre a Praia do Forte e Imbassaí, pois, segundo ele, há navios que têm o mau hábito de lançar lixo no mar, mas em sacos plásticos que não deveriam se romper nem chegar à costa. “A explicação pode ser a incidência de ventos de leste, muito comuns naquela área”, diz o pesquisador da USP. O Giro Tropical, um conjunto de correntes marítimas, poderia estar trazendo os objetos lançados de qualquer navio que passasse pelo Atlântico, entre África e Brasil.
Por outro lado, a oceanógrafa Ceci Moreira de Souza, do Instituto Oceanográfico da Universidade de São Paulo - USP, acredita que essas embalagens certamente são provenientes de embarcações que passam próximas à costa brasileira. “A possibilidade do material ter sido trazido de locais distantes como a Europa, por correntes marítimas, é praticamente nula”, afirma ela.
A Capitania dos Portos de Salvador informou que durante o verão de 2001, aproximadamente 350 navios estrangeiros cruzam as águas baianas em direção aos portos de Salvador, Ilhéus e Porto Seguro, trazendo turistas e cargas, e alguns, como o transatlântico italiano Rhapsody com capacidade para 800 passageiros, podem atracar até uma vez por semana durante nesse período.
The International Convention for Preservation of Pollution from Ships, uma espécie de bíblia da navegação internacional na área ecológica, em vigor desde 1973, mais conhecida como Marpol, determina que toda embarcação deve manter, sempre à vista, recipientes para juntar os resíduos produzido a bordo, sendo proibido, a qualquer embarcação, jogar lixo no mar. Porém, a fiscalização no Brasil, a cargo da Capitania dos Portos e da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) é deficitária, pois, para fiscalizar os 950 quilômetros do litoral da Bahia, a Marinha dispõe apenas de 9 embarcações e um efetivo de 50 homens. “O descarte de lixo em alto mar é um crime comum no litoral do Brasil”, diz a ambientalista do Greenpeace Viviane Silva.
Segundo Manuel Argolo da Cruz, chefe do departamento de segurança de tráfico aquaviário da Capitania dos Portos da Bahia, cerca de 35% das embarcações são abordadas por fiscais que devem verificar desde o estado de conservação do barco até o destino dado ao lixo. “A maioria dos barcos não joga lixo no mar, mas muitos apresentam indícios de terem jogado”, diz, admitindo não conhecer nenhuma multa aplicada por isso. “É difícil provar”.
Com um litoral muito extenso, o descarte de lixo em águas brasileiras, tanto por parte de passageiros quanto por parte das tripulações, pode ser feito de modo ilícito, a qualquer hora do dia ou da noite, sem testemunhas. O descarte de lixo na faixa de 200 milhas do mar territorial brasileiro é um crime passível de multa que pode variar de R$ 7 mil a R$ 50 milhões. “Apesar do rigor da multa, um flagrante, nesses casos, é praticamente impossível”, justifica o capitão-de-fragata e comandante interino da Capitania dos Portos de Salvador, Sérgio Silveira.
“Este tipo de crime só acontece porque o país não tem o respeito da comunidade internacional”, acredita o ambientalista Juca Ferreira, vice-presidente da Fundação Onda Azul e secretário executivo do Ministério da Cultura. Segundo ele, o Brasil precisa modernizar o conceito público de gestão econômica do seu território marinho que se estende por 200 milhas náuticas ao longo do litoral brasileiro. Até agora o país só discutiu a questão do ponto de vista financeiro e enquanto isso, nos tornamos quintal das grandes potências”, afirma Juca Ferreira.
Nos Estados Unidos, por exemplo, os comandantes dos navios que sujam a costa americana chegam a ser presos. Em todos os portos americanos, principalmente onde o fluxo turístico é maior, são distribuídos folhetos e material educativo sobre a importância de se preservar os mares e as campanhas contam com o apoio de voluntários e da sociedade organizada. Porém, quando estão fora das águas territorias americanas, esses navios parecem se esquecer de tudo isso e acabam jogando seu lixo em águas internacionais e de outros países.
Outro problema do lixo jogado no mar é que ele representa uma ameaça à fauna local, “os plásticos e vidros são perigosos sobretudo para os mamíferos marinhos e tartarugas”, explica o biólogo Gustave Lopez, coordenador técnico na Bahia do Projeto Tamar. Lopez cita um vídeo que mostra uma tartaruga com dificuldades para desovar porque sua cloaca estava obstruída por um saco plástico, “que são engolidos com frequência pelos animais porque os confundem com algas”.
Pelos dados do Projeto MAMA - Mamíferos Marinhos, somente no ano de 2000, quatro golfinhos apareceram mortos em praias do litoral de Salvador, vítimas da ingestão de plásticos, pois os animais, que têm a visão pouco apurada, costumam confundir esse tipo de lixo com sua presa predileta, a lula. No caso mais grave, registrado na praia do Canta Galo (Cidade Baixa de Salvador), em 1998, um golfinho adulto foi achado morto sem sinais de ferimentos e, durante a autópsia, os veterinários encontraram em seu estômago um pacote de arroz Uncle Bens, de fabricação norte americana. Ainda no ano de 2000, mais um animal foi vítima da poluição marinha, dessa vez um filhote de baleia Jubarte, com aproximadamente um ano de vida, pois ingeriu 3 tampinhas de garrafa pet que ficaram presas em sua garganta retendo a passagem do leite. “O animal acabou morrendo de inanição”, diz Luciano Wagner, coordenador do projeto, dessa vez o lixo era de origem brasileira.
Fabiano viu nessa triste realidade um desafio e uma oportunidade para retribuir ao oceano tudo o que ele já havia lhe proporcionado e continua proporcionando, firmando o compromisso pessoal de divulgar informações relacionadas ao lixo marinho, através de suas fotos ou de publicações na mídia, batizando essa ação de Praia Local, Lixo Global.
“Este estudo, é o primeiro que se tem conhecimento na Bahia relacionado à origem do lixo que chega às praias, trazidos através dos movimentos das marés” (Revista Travessia, abril de 2001).
A ação Praia Local, Lixo Global, que hoje conta com o financiamento da fundação alemã Lighthouse Foundation e com mais 3 programas de ação, id Garbage, Onda Verdee Amigos do Lixo, visa divulgar, pesquisar e combater o lixo global. Atualmente, o lixo marinho global que invade a Costa dos Coqueiros está sendo coletado e monitorado por estudantes e turistas para, futuramente, possibilitar a identificação dos navios poluidores.
Fontes: Desconhecida